Grande estudo traz esperança aos que sofrem de alergia alimentar


terça-feira dezembro 16, 2008

Para o menino Sean Batson, de cinco anos de idade, até mesmo um beijo de avó é temido. “Minha mãe estava usando batom, e quando ela beijou a bochecha de Sean, o menino teve urticárias”, disse sua mãe, Jennifer Batson.

Em sua primeira festa de aniversário, Sean teve uma grave reação alérgica – urticárias, inchaço nos olhos, náuseas e dificuldades na respiração – na primeira garfada de bolo. E quando uma criança com um cone de sorvete tocou o braço de Sean com as mãos grudentas durante uma festinha, sua pele irrompeu em erupções.

A luta diária de viver com as alergias de Sean a alimentos e produtos praticamente inevitáveis – soja, ovos e leite, do qual podem aparecer traços mesmo em produtos não-alimentícios como batons – estimularam Jennifer Batson e seu marido, Tim, a participar de um projeto que cientistas estão chamando de “o mais abrangente estudo de alergia alimentar até hoje”.

O estudo internacional, conduzido por Xiaobin Wang e Jacqueline A. Pongracic do Hospital Memorial Infantil de Chicago, busca causas de alergia alimentar através do exame de centenas de famílias em Boston, Chicago e na província de Anhui, na China.

Utilizando questionários e entrevistas, os investigadores estão reunindo dados numa ampla escala de fatores ambientais, genéticos e de saúde, entre eles a dieta, a higiene, o número de animais de estimação e os históricos médicos pré e pós-natal das crianças.

Wang diz que o projeto do estudo, realizado em diferentes locais, permite que os pesquisadores observem impressionantes variações na incidência e nos tipos de alergias através de diversas populações e regiões.

Na China, por exemplo, exames de pele descobriram que grandes porcentagens de uma população rural eram sensíveis a moluscos (16,7%) e amendoim (12,3%). Ainda assim, alergias alimentares reais naquela população, conforme foi diagnosticado pelos médicos, eram praticamente desconhecidas: menos de 1%.

Nos Estados Unidos, em contraste, 12 milhões de pessoas (4% da população) sofrem de alergias alimentares, de acordo com a Rede de Alergia Alimentar e Anafilaxia, um grupo sem fins lucrativos de informação.

“Encontramos algo inesperado,” disse Wang, diretora do Programa Smith de Pesquisa de Saúde Infantil no Memorial Infantil. “A aparente dissociação entre alta sensibilização alérgica e baixa taxa de doenças alérgicas nesta população chinesa não é encontrada em nenhuma de nossas duas populações de estudo nos EUA.

“O que pode explicar a diferença entre China e EUA?” ela perguntou. “Seria uma exposição rural contra urbana? Dieta e modo de vida? Ou suscetibilidade genética? Essas são questões para as quais estamos tentando encontrar algumas respostas claras.”

Para Sean Batson e família, uma recente avaliação clínica no hospital incluiu um exame de pele para estabelecer dados de referência para a irmã de Sean, Audrey, de um ano, que não parece ter alergias alimentares (assim como seus pais, Tim Batson, 38, programador de computadores, e Jennifer Batson, 36, revisora).

Sean passou por um novo exame de pele. O breve desconforto foi abrandado por um episódio de Bob Esponja, passando num pequeno monitor afixado a uma poltrona acolchoada reclinável.

Wang disse que sua própria consciência das alergias alimentares aumentou depois que seus filhos gêmeos entraram no jardim da infância e passaram a trazer uma vários papéis advertindo sobre graves alergias entre seus colegas de classe.

“Voltando 10 ou 15 anos, durante meu treinamento na residência pediátrica, havia muito pouca informação sobre alergias alimentares,” disse Wang, uma entre os 12 importantes investigadores recentemente brindados com concessões pelo Instituto Nacional de Saúde para conduzir pesquisas inovadoras sobre o tema.

Realmente, com dados recentes mostrando um aumento acentuado no número de alergias alimentares – que não pode ser explicado por uma falta de detecção nos anos passados – os institutos começaram uma iniciativa para abordar as alergias alimentares como um desafio de saúde emergente.

Embora seja possível ter alergia a qualquer alimento, oito comidas representam 90% de todas as reações – leite, ovos, amendoim, frutos do mar, soja, trigo, e nozes de árvores como caju e amêndoa.

Até 200 mortes por ano são atribuídas à reação mais grave, a anafilaxia induzida por comida, que também resulta em 30 mil atendimentos no pronto-socorro. Alguns especialistas sugerem que crianças numa cultura fanática por detergentes anti-bactericidas e desinfetantes para as mãos são expostas a menos germes, privando o sistema imunológico de sua função de luta e levando-o a classificar erroneamente alguns alimentos como estranho.

Mas isso ainda é apenas uma hipótese, e muitos pesquisadores dizem que as causas de alergias alimentares são altamente complexas, e que a “hipótese da higiene” não pode ser a única explicação.

Pongracic, que trata de crianças com alergia há 17 anos, diz que mesmo pequenos resquícios de agentes alérgicos podem causar reações fatais.

“Esperamos que nossa pesquisa possa levar a novas maneiras de prever qual criança tem probabilidade de desenvolver a alergia alimentar,” escreveu ela por e-mail, acrescentando que médicos esperavam criar tratamentos “que possam diminuir a severidade de uma reação alérgica, e até mesmo proteger contra a reação.”

A frustração pela falta de financiamento para pesquisas de alergia alimentar levou um casal da área de Chicago, David e Denise Bunning, a doar três milhões de dólares ao estudo do Memorial Infantil. Como pais de duas crianças com perigosas alergias alimentares, eles dizem que esperam convencer os legisladores de que as alergias merecem uma atenção pública tanto quanto outras doenças infantis crônicas – como a asma e a diabetes tipo 1.

“Primeiro eu pensei, ‘OK, você tem essa criança uma-em-um-milhão com uma grave alergia a alimentos, e simplesmente tem que lidar com isso,’” disse David Bunning, corretor financeiro. “Mas quando aprendemos que tanto Bryan quanto Daniel tinham graves alergias alimentares, havia muita descrença. Parecia que estávamos nos escondendo de um fantasma.”

Denise Bunning, uma ex-professora, acrescentou: “Agora, estamos bastante animados com as descobertas futuras do estudo sobre alergia. Precisamos começar a olhar a alergia alimentar não como algo que você escolhe, mas como uma doença infantil com reações potencialmente fatais.”